♫ OPINIÃO
♩ Em entrevista a uma emissora de rádio, Pedro Cardoso carregou no tom ao criticar de forma generalizada a música sertaneja e os artistas associados a esse som que domina o mercado musical brasileiro.
O ator tem todo o direito de detestar o som pop sertanejo que reina nas playlists nacionais. Até porque esse sertanejo do mainstream é música produzida em escala industrial que obedece fórmulas comerciais.
Só que Cardoso extrapolou ao tratar os artistas sertanejos como gado, generalizando tendências e opções estéticas e políticas como se toda a categoria pensasse e agisse do mesmo jeito.
“Não sei se tem algum artista verdadeiro ali. Mas, na minha opinião, é uma temática completamente monótona e de baixíssima inspiração. Não é à toa que essa é a música do fascismo brasileiro. É uma música vazia, de interesse teórico, sobre assunto nenhum. É uma música sobre nada, sobre ser corno ou não ser corno”, disparou o ator.
Associar a música sertaneja ao fascismo é exagero. Há, sim, duplas e cantores identificados com líderes da extrema direita do Brasil. Contudo, também há artistas de outras ideologias políticas. Há até casos em que, numa dupla sertaneja, os dois cantores têm pensamentos políticos divergentes.
Quanto às letras repetitivas, há lógica no pensamento do ator, mas cabe lembrar que abandono, cornitude e desilusões amorosas são temas recorrentes e dominantes em qualquer gênero musical. Há compositores que abordam o (des)amor de forma mais poética e refinada. E há compositores que versam sobre o tema de forma mais simplista, direta, e mal nenhum há nisso. Tem quem deteste, como Pedro Cardoso. Tem quem goste e se identifique, como a maioria do povo brasileiro, por questões culturais.
Em uma democracia, é preciso respeitar o gosto alheio. Inclusive o musical. Qualquer pessoa tem o direito de, exercendo a liberdade de expressão, manifestar uma opinião contrária ao som sertanejo, como fez Pedro Cardoso. Ou ao rock. Ou ao funk. Ou mesmo à MPB, gênero preferido entre as elites culturais do Brasil.
Só que, ao qualificar os cantores sertanejos de “comerciantes agrícolas brasileiros muito apegados à cultura estadunidense”, Cardoso mais uma vez peca pelo tom agressivo e pela crítica generalizada. Sem falar que o comentário soa injusto.
Afinal, a influência da música norte-americana é notória na música brasileira. A bossa nova bebeu do jazz. O rock da Jovem Guarda simplificou o iê-iê-iê dos Beatles. Algumas bandas do rock brasileiro dos anos 1980 faziam som calcado na matriz de grupos ingleses e/ou norte-americanos. A estética country está presente na música sertaneja do século XXI, sim, mas e daí?
No fundo, o discurso de Pedro Cardoso reflete uma velha questão do Brasil: a tendência de uma classe social tentar impor um gosto cultural sobre outra classe mais popular.
Artistas sertanejos merecem respeito. Até porque é o tempo, e não Pedro Cardoso, que vai pôr cada um no devido lugar...
Publicada por: RBSYS