Disco inédito sai em 28 de outubro, exatos 30 anos após o encontro dos artistas em show que transitou bem entre a canção, o samba, a seresta e a toada. Capa do álbum ‘Ao vivo – 1994’, de Zé Renato & João Carlos Assis Brasil
Arte de Philippe Leon
♫ OPINIÃO SOBRE DISCO
Título: Ao vivo – 1994
Artista: Zé Renato e João Carlos Assis Brasil
Cotação: ★ ★ ★ ★ ★
♪ Em 28 de outubro de 1994, uma sexta-feira, Zé Renato subiu ao palco da Sala Cecília Meireles – palco de concertos de música erudita na cidade do Rio de Janeiro (RJ), mas que eventualmente abre as cortinas para artistas populares – para fazer show com o pianista João Carlos Assis Brasil (28 de agosto de 1945 – 6 de setembro de 2021) no projeto Sexta básica.
Em abril daquele ano de 1994, Zé Renato subira de patamar na música do Brasil com a edição do aclamado quarto álbum da discografia solo do cantor, Arranha-céu, disco dedicado ao repertório do cantor e compositor carioca Silvio Caldas (23 de maio de 1908 – 3 de fevereiro de 1988), voz imponente na música brasileira das décadas de 1930 e 1940.
Foi com o status de ter lançado um dos grandes discos de 1994 que Zé Renato (voz e percussão) reiterou a excelência do canto ao seguir o roteiro de show feito com Assis Brasil ao piano e com o trio formado pelos músicos Marcos Ariel (piano), Marco Pereira (violão) e Omar Cavalheiro (baixo).
Captado em fita cassete guardada no baú que Zé Renato confiou a Maurício Gouvêa, o show ganha registro em disco a partir da gravação ao vivo, masterizada por Ricardo Carvalheira.
Em 28 de outubro de 2024, exatos 30 anos após a apresentação de Zé Renato e Assis Brasil na Sala Cecília Meireles, o álbum Ao vivo – 1994 chega ao mundo digital em edição da gravadora Discobertas, do pesquisador Marcelo Fróes, com capa criada por Philippe Leon e produção artística de Maurício Gouvêa e Memeca Moschovich.
E o fato é que um dos grandes discos de 2024 foi gravado em 1994... Zé Renato arranha o céu em Ao vivo – 1994 com os agudos que exprimem a profunda melancolia de Maringá (Joubert de Carvalho, 1931), canção tornada de Silvio Caldas desde que o Caboclinho querido a gravou em 1957.
Vinte anos antes, em 1937, Caldas lançou Arranha-céu, parceria com Orestes Barbosa (1893 – 1966) revivida por Zé Renato em tom seresteiro em duo com o violão virtuoso de Marco Pereira em número alocado na abertura do disco.
No mesmo clima de seresta, o cantor revisita o samba-canção Serra da boa esperança (Lamartine Babo, 1937). Já o samba Faceira (Ary Barroso, 1931) cai em suave suingue com Zé na companhia dos quatro músicos do show.
Na sequência, o duo de voz e piano em Sem você (Antonio Carlos Jobim e Vinicius de Moraes, 1959) justifica o nome de João Carlos Assis Brasil na capa do álbum. O canto preciso de Zé Renato, sóbrio e sem melodrama, se afina com o toque de classe do piano de Assis Brasil.
Chamariz do show, o duo do cantor com o pianista é repetido ao longo do disco na abordagem refinada de outra canção do amor demais, Serenata do adeus (Vinicius de Moraes, 1958); na lembrança de A lenda do caboclo (Heitor Villa-Lobos, 1920) – tema modernista, sem letra, levado por Zé Renato nos vocalizes – e em Elba (1990), denso tema (também) sem letra da lavra do irmão de João, o saxofonista e compositor carioca Victor Assis Brasil (28 de agosto de 1945 – 14 de abril de 1981).
A lenda do caboclo, Elba e Our love is here to stay (1938) – canção ouvida na voz de Zé Renato em medley quase todo instrumental feito por João Carlos Assis Brasil com obras dos compositores norte-americanos George Gershwin (1898 – 1937) e Ira Gershwin (1896 – 1983) – são músicas cantadas por Zé Renato somente neste show com Assis Brasil, que sola outros dois temas do irmão, Blues (1990) e Waltzing (1980), além de tocar sozinho o Prelúdio (1941) das Bachianas de Villa-Lobos (1887 – 1959).
Reunidos no palco, cantor e músicos caem no samba Promessa (Custódio Mesquita e Evaldo Ruy, 1943), acertam o passo do fox Mulher (Custódio Mesquita e Sady Cabral, 1940) e, em trilho ruralista, fazem o link sagaz da morena da toada A saudade mata a gente (João de Barro e Antônio Almeida, 1948) com a morena da Toada (Na direção do dia) (Zé Renato, Claudio Nucci e Juca Filho, 1978) do grupo Boca Livre.
No arremate do álbum Ao vivo – 1994, há outro link esperto, o dos sambas Pedra que rolou (Pedro Caetano, 1940) e Minha palhoça (J. Cascata, 1935), cantados com agilidade e verve por Zé Renato, que deita e rola no ritmo.
Seja no samba, na seresta, na toada ou na canção jazzística, Zé Renato arranha o céu neste oportuno álbum com a gravação inédita de show singular que documenta um cantor e um pianista em total sintonia e em estado de graça.
Zé Renato canta músicas inéditas na voz do cantor, como ‘A lenda do caboclo’ e ‘Our love is here to stay’, no álbum ‘Ao vivo – 1994’
Alexander Landau / Divulgação
Publicada por: RBSYS